Doutor Paulo Panaro fala do trabalho do Controle Externo Concentrado da Atividade-Fim Policial do MP

Data da postagem: 16/09/2016

O Ministério Público do Estado do Espírito Santo criou, em março de 2015, a 20ª e 21ª Promotorias de Justiça Criminal de Vitória com atribuição no Controle Externo (modalidade concentrada) da Atividade-Fim Policial, com abrangência na capital capixaba, Vila Velha, Cariacica e Serra. Foram criadas após a extinção do Grupo Executivo de Controle Externo da Atividade Policial (Gecap), em maio de 2014.


 


Já em 25 de maio de 2015, o promotor de Justiça Paulo Panaro Figueira Filho, que atua na Promotoria Criminal de Vitória e no Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (GAECO), tomou posse como titular da 21ª Promotoria de Justiça Criminal, acumulando também a 20ª – ambas têm atribuições idênticas – por motivo de aposentadoria da titular.


 


Nesta entrevista ao Portal da Associação Espírito-Santense do Ministério Público (AESMP), o doutor Paulo Panaro explica como é o seu trabalho no Controle Externo (modalidade concentrada) da Atividade-Fim Policial. Paulo Panaro Figueira Filho atua há cerca de 36 anos no sistema de Segurança e de Justiça Criminal. Em 1979, ele ingressou na Polícia Civil do Estado do Espírito Santo, como Perito Criminal, onde permaneceu 12 anos, e desde 1992 é Promotor de Justiça, depois de ser aprovado em concurso público, sem contar que atuou como advogado por cinco anos.


 


"O controle externo deve buscar o aprimoramento das polícias, o que implica contribuir para avanços e evitar que estas trilhem caminhos equivocados que as afastem do cumprimento adequado e eficaz de seus deveres”, faz questão de ressaltar o doutor Paulo Panaro.


 


Como é o serviço:


No Espírito Santo, o Ministério Público Estadual é responsável pelo controle externo da atividade-fim das Polícias Civil e Militar, Corpo de Bombeiros e Guardas Municipais (agentes comunitários e de trânsito). No caso da Polícia Militar e do Corpo de Bombeiros Militar, a fiscalização é feita pela Promotoria de Justiça Junto à Auditoria Militar, a quem cabe, quando necessário, propor ações judiciais de natureza criminal. Quando se trata de ações Cíveis (Improbidade Administrativa), a responsabilidade é da 20ª ou 21ª Promotorias de Justiça Criminal de Vitória. Já os agentes penitenciários têm sua atuação fiscalizada pelo Grupo Especial de Trabalho em Execução Penal do MPES (Getep).


 


Quando um policial comete um crime, essa conduta pode resultar em dois tipos de ações: Criminal e Improbidade Administrativa. A ação Criminal em se tratando de PMs é proposta pela Promotoria de Justiça Junto à Auditoria Militar de Vitória; e, a de Improbidade Administrativa, pela 20ª ou 21ª Promotoria de Justiça Criminal, além da sanção pela prática de infração disciplinar aplicadas administrativamente pelas respectivas instituições.


 


No entanto, em relação às questões inerentes à Improbidade Administrativa, estas devem estar vinculadas geralmente à atividade-fim policial, sem se descartar, no entanto, a possibilidade de ocorrer o ato ímprobo em virtude do cometimento de uma infração disciplinar ou mesmo pela má conduta social do policial, seja ele militar, civil ou guarda municipal.


 


Objetivos do Controle Externo da Atividade-Fim Policial:


Evitar possíveis irregularidades e abusos cometidos por policiais no exercício da função e aprimorar a investigação de crimes, aperfeiçoando a produção de provas pela Polícia Judiciária. São esses os objetivos do Controle Externo da Atividade-Fim Policial exercido pelo Ministério Público Estadual, por todos Promotores de Justiça que atuam na área Criminal na modalidade difusa, e por meio da 20ª e da 21ª Promotorias de Justiça Criminais de Vitória, na modalidade concentrada, com atribuições que abrangem, além da capital, os municípios de Cariacica, Serra e Vila Velha. Essa função do Parquet é assegurada pela Constituição Federal, no artigo 129, inciso VII, bem como pela Constituição Estadual e Leis Orgânicas do Ministério Público da União e dos Ministérios Públicos dos Estados.


 


O controle externo pelo Ministério Público consiste em fiscalizar a atividade-fim da Polícia, tanto na prevenção, como na investigação de fatos definidos como infrações penais, fazendo com que sejam preservados direitos e garantias constitucionais das pessoas presas, principalmente, bem como o estrito cumprimento das determinações judiciais. O Controle Externo da Atividade Policial também atua junto aos órgãos de segurança pública no que diz respeito às políticas de segurança.


 


O atendimento do direito à segurança pública deve ser eficaz e os direitos e garantias individuais devem ser preservados e assegurados, sendo imperioso que o exercício do Controle Externo da Atividade-Fim Policial considere esses dois pontos. Vale dizer, o controle externo deve buscar o aprimoramento das Polícias, o que implica contribuir para avanços e evitar que estas trilhem caminhos equivocados que as afastem do cumprimento adequado e eficaz de seus deveres perante a sociedade, previstos na Constituição da República e nas leis, particularmente, no que diz respeito ao trato com o cidadão, que ainda é muito desrespeitoso e truculento, assim como na eficiente produção de provas que apesar dos avanços, ainda permanece muito deficitária.


 


Inspeções nas unidades da Polícia Civil


Vale ressaltar que os cargos de 20º e 21º Promotor de Justiça Criminal de Vitória foram criados em março de 2015 e providos no final do mês maio daquele ano. Essas Promotorias de Justiça, com atribuição no Controle Externo (Concentrado) da Atividade-Fim Policial, já realizaram inspeções nas 66 unidades de Polícias Judiciárias (Delegacias de Polícia Civil), de Perícia Criminal, Identificação (Civil e Criminal), Médico Legal e laboratório de DNA da Polícia Civil dos municípios de Cariacica, Serra, Vila Velha e Vitória em novembro e dezembro de 2015, abril e maio de 2016. Novas inspeções estão previstas para os próximos meses de outubro e novembro de 2016. Em pouco mais de um ano de atividade, o ‘Controle Externo da Atividade-Fim Policial’ do MPES, através das 20ª e 21ª Promotorias Criminais de Vitória, já realizou duas inspeções das unidade, caminhando para realização da terceira.


 


Cada período de realização das inspeções dura, normalmente, dois meses. Fazemos 66 visitas em cada período de inspeção. Ao final, enviamos relatório ao Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) e encaminhamos requisições, e/ou recomendações, bem como solicitação de qualquer providência que seja necessária, à Chefia de Polícia Civil, aos Comandos das Guardas Municipais, e a qualquer outro órgão a quem caiba a resolução do problema detectado durante a inspeção.


 


Já as inspeções nas unidades da PM e do Corpo de Bombeiros são realizadas pela 2ª Promotoria da Promotoria de Justiça Junto à Auditoria Militar.


 


Situação das Delegacias de Polícia:


Já no primeiro período de inspeções das unidades de Polícia Judiciária, ficou claro a necessidade de melhor se apurar através da formalização de procedimento as condições estruturais (física e de pessoal) e de trabalho de todas as Delegacias de Polícia da Grande Vitória, além das unidades das perícias. De uma forma geral constatou-se que não há delegacias que possam servir de modelo: todas têm problemas; umas mais, outras menos. Contudo, ficou patente que todas, sem exceção, precisam de melhorias – algumas delas, pela sua precariedade, necessitam de uma nova estrutura física.


 


A situação, entretanto, tem de ser observada sob outros ângulos. Um deles talvez seja a falta de investimento. Às vezes, há investimento, mas, na minha opinião, sem planejamento adequado e oportuno. Mas o grande fator, a meu ver, é a questão organizacional das unidades policiais. Nas inspeções realizadas, observamos, por exemplo, que não há um controle do quantitativo de Inquéritos Policiais instaurados e mantidos nas delegacias (tramitando). Exemplo disso é que, quando questionados os responsáveis sobre o quantitativo de IPs existentes, ou seja, em tramitação na unidade policial no dia 31 de dezembro do ano anterior, e o número de IPs instaurados a partir do dia 1º de janeiro do ano seguinte até a data da inspeção e que ainda estão em tramitação na mesma unidade, o saldo nunca é exato, nem mesmo por amostragem.


 


Observamos que não há controle dos prazos prescricionais, o que resulta em diversos crimes alcançados pelo instituto da prescrição dentro das unidades policiais, e isso acarreta impunidade, contribuindo para o aumento do índice de violência. Também não há controle dos prazos concedidos para realização de diligências requisitadas pelo MP. Igualmente, não há controle do quantitativo de ocorrências investigativas sem instauração de Inquéritos Policiais ou Termo Circunstanciado de Ocorrências, além de muitos outros.


 


Não há de se negar que a falta de investimento em segurança pública, sobretudo na Polícia Judiciária em nosso Estado, é algo histórico por parte dos gestores-políticos. Posso falar isso porque, antes de entrar para o Ministério Público, fui Perito Criminal da Polícia Civil, onde entrei em 1979 e saí em 1992. Hoje, boa parte dos equipamentos técnicos-científicos existentes nos Departamentos da Superintendência de Polícia Técnico-Científica (Criminalística, DML, Identificação e DNA), são frutos de doação da Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp), do Ministério da Justiça, havendo é claro, contrapartida do governo estadual, por meio de convênio.


 


Também devemos reconhecer que boa parte deste problema é acarretada pela absurda defasagem existente no quadro de pessoal, tanto de Delegados, como de Escrivães e Investigadores de Polícia, eis que o número de policiais hoje existentes em nada se aproxima do Q.O. (Quadro Organizacional) da Polícia Civil em vigor, o qual ainda data de 1990, ou seja, que foi idealizado para uma sociedade/população existente a 26 (vinte e seis) anos atrás.  


 


Por outro lado, pelo que se observa e não podemos deixar de reconhecer, que houve relevantes avanços na investigação policial capixaba, principalmente na Polícia Técnico-Cientifica. Hoje, por exemplo, a Perícia Criminal possui excelentes profissionais, muitos deles são pós-graduados, mestres e doutores, e o setor aparentemente atua com número adequado de peritos. No entanto, o espaço físico onde se encontram instalados os Departamentos é pequeno, necessitando urgentemente de outras instalações para o exercício adequado e eficaz de sua essencial função, pois, como é sabido, a prova cientifica é a rainha das provas, o “coração da investigação”. A perícia, em tese, com todo respeito àqueles que pensam em contrário, dentre todas as provas produzidas na fase pré-processual, tal como no Inquérito Policial, a perícia é a única prova não repetida em Juízo, salvo exceções, sob o crivo do contraditório e da ampla defesa após o oferecimento/recebimento da denúncia.


 


Encaminhamento de denúncias:


Quando recebemos na 20ª e 21ª Promotorias Criminais de Vitória qualquer tipo de denúncia relacionada a policiais, se se referirem a PMs as encaminhamos à Promotoria de Justiça Junto à Auditoria Militar de Vitória. No entanto, se se tratarem de Policiais Civis, encaminhamos à Corregedoria da PC, porque a ela é que compete a imediata apuração, através da Delegacia de Crimes Funcionais, se a conduta se referir à prática de crime, bem como pela Delegacia de Acompanhamento Funcional que apura a infração disciplinar. Cabe às Corregedorias de Polícia, seja Militar ou Civil, realizarem o controle interno das respectivas instituições. Inclusive, as próprias Guardas Municipais devem ter também as suas Corregedorias. Nada impede, todavia, que o próprio Ministério Público instaure no âmbito de suas atribuições (controle externo) o procedimento investigatório, seja de natureza penal ou civil (PIC ou IC) para apurar o fato.


 


Respeito aos direitos humanos dos cidadãos:


O Controle Externo da Atividade-Fim Policial não visa uma caça às bruxas. Visa ao aprimoramento da Polícia; à eficácia das investigações; visa evitar a prática de abusos e ao respeito aos direitos humanos. Infelizmente, a polícia brasileira ainda não entendeu a importância da preservação dos direitos humanos do cidadão.


 


Cito a título de exemplo de desrespeito aos direitos humanos e que me chamou a atenção após assumir as atribuições da Promotoria onde atuo, foi um caso divulgado pela imprensa em março deste ano, em que no vídeo exibido na TV aparece um policial militar do Espírito Santo, durante uma abordagem a uma pessoa do sexo feminino, ocorrida em Vila Velha, por condução irregular de motocicleta e sem capacete. Após aparentemente ter algemado a condutora no bagageiro da  motocicleta, o policial a agride em seguida com um tapa no rosto. Nota-se no vídeo que o policial agrediu a moça com um soco no rosto mesmo ela estando algemada. O fato está em apuração.