Seminário no STJ vai debater os “10 anos da Lei de Drogas” no Brasil

Data da postagem: 17/04/2017

Ao mesmo tempo que parece ser consensual a necessidade de revisão da Lei de Drogas, existem, entre os especialistas no tema, diferentes pontos de vista sobre se a modificação da legislação deveria caminhar na direção da descriminalização dos entorpecentes ou, em sentido contrário, do fortalecimento das sanções, inseridos entre os polos do debate todas as opiniões intermediárias e seus argumentos igualmente fundamentados.    


 


Com opiniões distintas sobre o assunto, três desses especialistas – o promotor de Justiça José Theodoro Corrêa de Carvalho, a coordenadora do Centro de Referência em Drogas e Vulnerabilidade Associadas da Universidade de Brasília, Andrea Gallassi, e o professor Norberto Fischer, pai de menina que depende de tratamento à base de canabidiol – estarão presentes no seminário "10 anos da Lei de Drogas – Resultados e perspectivas em uma visão multidisciplinar”. O evento acontece nos dias 25 e 26 de abril no auditório do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em Brasília. 


 


Segundo o promotor de Justiça José Theodoro de Carvalho, a Lei 11.343/06 trouxe regras rigorosas para imputação, processamento e execução da pena no caso de tráfico de drogas, que possui natureza constitucional comparada ao crime hediondo. Contudo, de acordo com ele, após a declaração de inconstitucionalidade de alguns dispositivos da legislação pelo Supremo Tribunal Federal (STF), houve questionável abrandamento da punição para esses crimes. 


 


"Há processos em que o traficante foi flagrado em atividade de venda e foi apreendida uma arma raspada em seu carro, por exemplo, o que gera uma condenação de um ano e oito meses pelo tráfico privilegiado e uma condenação de dois anos pelo porte de arma de uso restrito”, ponderou o promotor de Justiça José Theodoro de Carvalho, que defende modificações na legislação para adequação da equiparação constitucional da hediondez do tráfico de drogas à interpretação trazida pelo STF.


 


Em outra perspectiva – e como fruto de sua participação em programas de recuperação de pessoas envolvidas com entorpecentes –, a professora Andrea Gallassi considera o Brasil um País conservador no enfrentamento da questão das drogas, que é encarada normalmente como um tema relacionado à polícia, Justiça e segurança pública, e não como uma questão de saúde, economia e cultura.


 


Para a professora, que considera "urgente” a revisão da Lei de Drogas, a proibição associada à criminalização do usuário contribui para a violência urbana nas grandes cidades e nas regiões de fronteira, situação agravada pela disputa entre organizações criminosas pelo “hipertrofiado e altamente rentável” comércio de entorpecentes.


 


A mudança do panorama normativo passa, segundo Andrea Gallassi, pela observação das práticas bem-sucedidas adotadas por outros países.


 


"A tendência internacional, e destaco aqui os nossos países vizinhos da América Latina, em especial o Uruguai, está apontando para a compreensão e abordagem deste fenômeno de uma forma que saia da esfera da proibição e passe para a de regulação, justamente pelos resultados trágicos que a guerra às drogas vem acumulando, que contabiliza muito mais mortes do que o uso de todas as drogas juntas, e o 'melhor pior’ exemplo que temos no Brasil é o da cidade do Rio de Janeiro”, destaca a professora.


 


Novas regulações


 


Pai de Anny, primeira brasileira a ter, em 2014, autorização judicial para importar medicamento derivado da maconha, o canadibiol, o professor Norberto Fischer vivenciou diariamente os resultados de um debate enfrentado, como apontou a professora Andrea Gallassi, sobre o prisma da criminalidade.


 


Todavia, para ele, apesar dos avanços pontuais que permitiram a atenuação do problema de saúde de sua filha, o Brasil não possui maturidade política, governamental e social para a simples liberação das substâncias para os usuários.


 


"É necessário avançar, mas me preocupa ter uma possível regulação pautada apenas por valores pessoais de políticos, muitas vezes sem a devida qualificação ou permeada de preconceitos”, ponderou Fischer, que defende que a revisão das regulações sobre o tema seja acompanhada por profissionais qualificados, organizações não governamentais e cidadãos interessados.


 


Segundo o professor, as mudanças legislativas também deveriam abarcar a regulamentação da produção nacional de medicamentos que usam produtos à base de substâncias atualmente consideradas ilícitas e, no caso da maconha, a regulação do autocultivo em situações específicas. 


 


"Precisamos ganhar celeridade nos processos para facilitar e viabilizar os estudos e pesquisas pela academia. Além disso, o tempo das famílias que possuem entes queridos sofrendo é bem diferente do tempo usualmente utilizado para regulamentações ou mudanças de leis. Temos pressa”, ressaltou Fischer.


 


O seminário


 


No seminário "10 anos da Lei de Drogas”, José Theodoro Corrêa de Carvalho, Andrea Gallassi e Norberto Fischer, em conjunto com juristas, antropólogos, médicos e outros profissionais de diversas áreas, discutirão a política de drogas adotada no Brasil e no mundo, as expectativas para uma nova abordagem do tema, as políticas públicas voltadas à assistência de dependentes químicos, o uso medicinal de substâncias proscritas, as questões relacionadas a encarceramento e gênero, bem como aspectos penais e processuais penais na judicialização dos crimes previstos na Lei de Drogas.


 


O evento, que tem inscrições gratuitas, é organizado pela Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (Enfam) e tem a coordenação científica do ministro Rogerio Schietti Cruz.


 


Confira a programação preliminar do evento.


 


(Fonte: Portal do STJ)