Senado aprova projeto que altera Lei de Abuso de Autoridade

Data da postagem: 27/04/2017

Plenário do Senado aprovou na noite de quarta-feira (26/04) o substitutivo ao projeto de lei que modifica a Lei de Abuso de Autoridade. O texto, do senador Roberto Requião (PMDB-PR), abrange atos que podem ser cometidos por servidores públicos e membros dos três poderes da República, do Ministério Público, dos tribunais e conselhos de contas e das Forças Armadas.


 


No texto aprovado, que agora vai para análise da Câmara dos Deputados, foram suprimidas expressões que poderiam dar margem para o criminalizar a hermenêutica. Também foi retirada a previsão de exercício de ação penal pública e privada de forma concorrente entre Ministério Público e ofendido, permitindo que qualquer pessoa que se sentisse prejudicada entrasse em juízo.


 


Para a CONAMP, o novo texto do projeto de abuso de autoridade precisa ser ainda mais aperfeiçoado, apesar dos avanços conquistados no Senado. Veja na Galeria de Fotos a presença dos dirigentes das Associações dos Membros do MP Brasileiro na votação do PL de Abuso de Autoridades no Senado.


 


 


No mesmo dia, à tarde, por unanimidade, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado já havia aprovado a proposta do senador Requião. Integrantes da Diretoria e do Conselho deliberativo da CONAMP acompanharam as duas  sessões. O texto final aprovado possui importantes modificações que foram resultados do diálogo travado pela CONAMP e demais entidades representativas do Ministério Público Brasileiro e do Judiciário com os parlamentares.


 


A CONAMP continuará atuando, de forma que o plenário da Câmara dos Deputados, para onde seguirá o projeto já aprovado no Senado, considere todas as contribuições apresentadas pela entidade.


 


Modificações


A proposição aprovada é na verdade uma alternativa (substitutivo) a dois projetos que tramitavam no Senado sobre o tema: o PLS 85/2017, do senador Randolfe Rodrigues (Rede/AP), e o PLS 280/2016, de Renan Calheiros (PMDB-AL).


 


No PLS 280/16 havia uma previsão que criminalizava a interpretação da lei - qualquer decisão judicial que não fosse conforme a literalidade da lei seria considerada crime de abuso de autoridade. Já no PLS 85/2017, houve mudança neste dispositivo, mas que ainda sim mantinha expressões ambíguas e imprecisas.


 


Por fim, foram suprimidas expressões que poderiam dar margem para criminalizar a hermenêutica. Também foi retirada a previsão de exercício de ação penal pública e privada de forma concorrente entre MP e ofendido, permitindo que qualquer pessoa que se sentisse prejudicada entrasse em juízo. O mecanismo havia sido considerado no primeiro parecer do relator, apresentado no dia 19 de abril.


 


Na versão final aprovada, foi afastada a possibilidade de ação penal privada e admitida tão somente a ação penal subsidiária, com a mesma redação do Código de Processo Penal, ou seja, só caberá ação penal privada se o Ministério Público se omitir da apreciação da matéria no prazo legal. A mudança foi inserida no relatório por meio de emenda do senador Antonio Carlos Valadares (PSB/SE).


 


Presidente da CONAMP faz avaliação


Para a CONAMP, o novo texto do projeto de abuso de autoridade precisa ser ainda mais aperfeiçoado. A presidente, Norma Cavalcanti, considerou que as alterações sobre possível previsão de crime de hermenêutica e ação privada são avanços positivos que garantem a autonomia do Ministério Público.


 


Os avanços no projeto de abuso de autoridade são fruto das constantes mobilizações da CONAMP e demais entidades representativas da magistratura e Ministério Público. A diretoria e os presidentes das afiliadas, além do permanente contato com os senadores nas respectivas unidades federativas, estiveram diversas vezes na capital do País conversando com os parlamentares a fim de apontar as inconstitucionalidades e as questões problemáticas dos projetos de abuso de autoridade.


 


A Associação Espírito-Santense do Ministério Público, em conjunto com a CONAMP e demais Associações Estaduais do MP, acompanha a tramitação dos projetos de abuso de autoridade desde o início. A temática ganhou destaque nacional em julho de 2016, quando o senador Renan Calheiros (PMDB/AL) apresentou o projeto de lei 280, que define os crimes de abuso de autoridade. A CONAMP publicou um estudo técnico em que analisa e critica o texto original do PLS 280/16.


 


Além da CONAMP, demais entidades do Ministério Público e do Judiciário foram contra o projeto, afirmando que a iniciativa era grave atentado contra a independência e a autonomia da Magistratura e do Ministério Público Brasileiros.


 


A entidade participou ainda de duas audiências públicas. "É um atentado contra o direito e dever de ação constitucional atribuído ao MP. Nós defendemos que os membros do MP continuem denunciando os crimes com as garantias permitidas pela Constituição Federal e pela nossa Lei Orgânica Nacional”, disse a presidente da CONAMP.


 


Em outra oportunidade, o 1º vice-presidente da CONAMP, Victor Hugo Azevedo, defendeu que o projeto tem intenção de criminalizar a ação de juízes, promotores e procuradores de Justiça, policiais e carcereiros na medida em que estão descritas apenas condutas penais aplicadas a estes cargos.


 


Senado retira o chamado "crime de hermenêutica"


O substitutivo de Roberto Requião ao PLS 85/2017, do senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), prevê mais de 30 ações que podem ser consideradas abuso de autoridade, com penas que variam entre seis meses e quatro anos de prisão. Além disso, as autoridades condenadas terão que indenizar a vítima. Em caso de reincidência, também pode haver a inabilitação para exercício da função pública por um a cinco anos e até mesmo a perda do cargo.


 


Entre as práticas classificadas como abuso de autoridade no substitutivo de Requião estão: obter provas por meios ilícitos; entrar em imóvel alheio sem determinação judicial; impedir encontro reservado entre um preso e seu advogado; decretar a condução coercitiva de testemunha ou investigado sem intimação prévia; fotografar ou filmar um preso sem o seu consentimento ou para expô-lo a vexame; e colocar algemas no detido quando não houver resistência à prisão.


 


O projeto prevê também punição para a popular "carteirada” — o ato de uma autoridade fazer uso do seu cargo para exigir vantagem ou privilégio indevido. Também será punida a autoridade que procurar colocar obstáculos à análise de um processo ao pedir vista por tempo excessivo, impedindo que ele seja apreciado pelo órgão colegiado ao qual ela pertence.


 


A Comissão de Constituição e Cidadania (CCJ) havia aprovado o projeto por unanimidade na manhã de quarta-feira, após a retirada do texto, do chamado "crime de hermenêutica". O substitutivo então foi ao Plenário em regime de urgência para que tivesse a sua análise concluída no mesmo dia.


 


Caso o projeto seja aprovado também pela Câmara dos Deputados, será revogada a atual legislação sobre abuso de autoridade, a Lei 4.898/1965.


 


Hermenêutica


Muito criticada por magistrados e membros do Ministério Público Brasileiro, a proposta também enfrentou oposição de diversos senadores até que se obtivesse apoio para aprová-la na CCJ e no Plenário.


 


Isso só aconteceu depois que Roberto Requião retirou do texto o risco do chamado "crime de hermenêutica” (punir magistrados e membros do Ministério Público por uma interpretação da lei que fosse revertida em instância superior) e a possibilidade de ações penais privadas a qualquer momento contra os crimes descritos.


 


O consenso alcançado na CCJ, onde houve aprovação unânime, foi destacado pelo presidente do Senado, Eunício Oliveira, que elogiou a articulação ampla entre os partidos e também com o Ministério Público. Ele também classificou o abuso de autoridade como uma "excrescência”.


 


Ao defender o projeto no Plenário, Requião afirmou que as instituições da República precisam se vigiar umas às outras, e que a aprovação do texto significava uma vitória da legalidade.


 


"Esta votação vai marcar a história do Senado na luta pelas garantias civilizatórias do Direito no Brasil”, comemorou.


 


Lava Jato


Senadores que criticaram o substitutivo, como Cristovam Buarque (PPS/DF), Reguffe (sem partido/DF), Magno Malta (PR/ES) e Ricardo Ferraço (PSDB/ES), manifestaram preocupação com sua influência sobre os rumos da Operação Lava Jato, da Polícia Federal, que investiga esquemas de corrupção no poder público federal e tem diversos parlamentares e ministros como alvo.


 


Randolfe Rodrigues, que encampou as reivindicações do Ministério Público ao apresentar o PLS 85/2017, elogiou a disposição de Roberto Requião em negociar, além de destacar o trabalho da CCJ, que produziu um texto melhor do que o projeto original. No entanto, ressaltou que algumas normas mantidas na redação final podem impor obstáculos excessivos ao trabalho de magistrados, promotores de Justiça e procuradores da República.


 


Cristovam Buarque (PPS-DF) apontou diversos trechos com subjetividade, em práticas que o texto classifica como "crimes de abuso de autoridade". E lamentou a falta de mais dispositivos voltados para os próprios parlamentares.


 


Ele considerou um "erro gravíssimo” colocá-lo em pauta e disse que o fato de o Congresso nunca ter discutido esse assunto antes das ações da Polícia Federal mostra que os senadores estão trabalhando para si mesmos.


 


"Não cometamos o abuso de autoridade de aprovar esse projeto em causa própria. Está claro que ele tem a ver com a Lava Jato. Vamos inviabilizar o trabalho de juízes, procuradores e polícia. Nenhum de nós está livre de ser denunciado amanhã. Eu quero me defender na Justiça, não impedindo a Justiça. Eu me nego a votar”.


 


O senador Jorge Viana (PT-AC) disse entender que houve "manipulação” da opinião pública ao longo dos debates sobre esse projeto, para que se estabelecesse a impressão de que ele tem como foco a Lava Jato. Ele disse que se trata apenas de superar a norma antiga, que, na sua opinião, não serve mais ao país.


 


Líder do DEM, o senador Ronaldo Caiado (GO) endossou o acordo que permitiu a aprovação do texto na CCJ, celebrando a retirada do "crime de hermenêutica". Ele argumentou que o substitutivo é resultado de amplos debates, salientando que a subjetividade apontada pelos críticos não compromete a matéria, já que em seu caput fica claro que o abuso se daria apenas em caso de interesse próprio da autoridade em questão, ou de perseguição pessoal.


 


(Com informações dos Portais do Senado e da CONAMP)